quarta-feira, 20 de julho de 2011

Friends: criar laços, "direitos e deveres"


Em tempos de escassez de tempo, hoje, no dia do amigo tomo por empréstimo alguns fragmentos dos capítulos XXI e XXV da insigne obra de Antoine de Saint-Exupéry, “O Pequeno Príncipe”.

“- Vem brincar comigo, propôs o princípe, estou tão triste...
- Eu não posso brincar contigo, disse a raposa.
Não me cativaram ainda.
- Ah! Desculpa, disse o principezinho.
Após uma reflexão, acrescentou:
- O que quer dizer cativar?  
- Tu não és daqui, disse a raposa. Que procuras? (...)
- Procuro amigos, disse [ele]. Que quer dizer cativar?
- É uma coisa muito esquecida, disse a raposa. Significa “criar laços”.
- Criar laços?
- Exatamente, disse a raposa. Tu não és ainda para mim senão um garoto inteiramente igual a cem mil outros garotos. E eu não tenho necessidade de ti. E tu não tens também necessidade de mim. (...)
A raposa calou-se e considerou por muito tempo o príncipe:
- Por favor... cativa-me disse ela.
- Bem quisera, disse o principezinho, mas eu não tenho muito tempo. Tenho amigos a descobrir e muitas coisas a conhecer.
- A gente só conhece bem as coisas que cativou, disse a raposa. Os homens não têm mais tempo de conhecer coisa alguma. Compram tudo prontinho nas lojas. Mas como não existem lojas de amigos, os homens não têm mais amigos. Se tu queres um amigo, cativa-me! (...)
Assim o principezinho cativou a raposa (...)
- Eis o meu segredo [disse a raposa]. É muito simples: só se vê bem com o coração. O essencial é invisível para os olhos. (...) Os homens esqueceram [a] verdade. Mas tu não a deves esquecer. Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas.”

Doravante no Capítulo XXV, arremata o principezinho:
“- Os homens de teu planeta cultivam cinco mil rosas num mesmo jardim... e não encontram o que procuram (...) E no entanto o que eles buscam poderia ser achado numa só rosa, ou num pouquinho d'água... Mas os olhos são cegos. É preciso buscar com o coração (...).”

Não são poucos que contam seus “amigos”, pelo número de seguidores que possuem em suas “redes sociais”, ledo engano. Não sou do contra, mas ainda prefiro prezar pela restrita qualidade de meus amigos legítimos.

terça-feira, 5 de julho de 2011

Primeiras Linhas: Justiça, ponto de saturação



Fundamente sua resposta. Tenebrosa elocução que os professores persistem alocar em provas. E se você perguntar a alguém o porquê dela escolher cursar Direito, com certeza ouvirá diversas formas de fundamentação ofuscadas – “falta de opção, status, pecúnia, justiça, aptidão” etc., etc.

Inobstante, posso dizer que, apenas, tive vontade. Sabe aquele: “Know your rights”? Foi exatamente isso. Vontade deliberada de ter ciência do conteúdo e da estrutura dessa seara única, que possibilita chegar-se a um dos poderes estatais.
Como sempre andei distante dos mundos quiméricos, nesses dois anos de estudos não tive desilusões. Afinal, não é difícil identificar que o Sistema Jurídico tem por escopo basilar regrar as condutas dos indivíduos, dirimindo conflitos mediante a coerção da conspícua sanção jurídica. Pretendendo, assim, garantir a segurança do próprio sistema, “preservando o passado e prevendo o futuro” e, não objetivando a “valiosa justiça”. E nem assim, poderia, pois, o magistrado como ser social que é não possui onisciência ou onipresença, “tentar [vê-lo], como ser absoluto, longe do mundo, [que o condiciona], é ver no homem um aspecto divino” (CATÃO, 2007. p. 50). Destarte, sua cognição e, por consequência, decisão, chegam a “verdade processual”, por meio do que lhe é apresentado. Essa é a saturação máxima daquele sistema.
Muito embora, “injustiças” sempre ocorrerão, mesmo que seja uma proporção genérica e abstrata, a justiça, igualmente, será ambicionada. Não pretendo adentrar nos conceitos filosóficos dogmáticos de justiça, pois, como dito é amplamente valorativa, de sorte que a sua substância depende do alvedrio de cada indivíduo, ou, de protótipos sociais impostos pelo coletivo. No entanto, não posso deixar de trasladar um trechinho de um poema de Bertolt Brecht, em que o conceito justiça tornar-se uma deliberação gratuita.

O PÃO DO POVO
“A justiça é o pão do povo.
Às vezes bastante, às vezes pouca.
Às vezes de gosto bom, às vezes de gosto ruim.
Quando o pão é pouco, há fome.
Quando o pão é ruim, há descontentamento.
Fora com a justiça ruim!
Cozida sem amor, amassada sem saber!
A justiça sem sabor, cuja casca é cinzenta!
A justiça de ontem, que chega tarde demais!
Quando o pão é bom e bastante
O resto da refeição pode ser perdoado.
Não pode haver logo tudo em abundância.
Alimentado do pão da justiça
Pode ser feito o trabalho
De que resulta a abundância.
Como é necessário o pão diário
É necessária a justiça diária (...).”

Diante disso, em final, vemos que a todo tempo haverá insatisfações, no que toca o critério justiça estimado por um dos litigantes, mesmo que o conhecedor da tecnica jurídica, tenha tentado ser mais Deus e menos Homem.